CAUSAS E EFEITOS
Enquanto Leny
procurava a maneira mais aceitável de apresentar Osmar a seus pais sem
transtornos e aborrecimentos, revelações e confidências bombásticas no meio do
caminho mudaram o rumo da sua intenção e o sentimento de alguns personagens
envolvidos na história. Verdades que tanto podem ser surpresas para alguns,
como péssimas notícias para outros, motivaram reações inesperadas de quem as
recebe. Se por um lado Leny magoou seu pai ao revelar que Alexandre não era o
pai da criança, ela também não aceitou e se rebelou com a notícia passada por
Osmar sobre a gravidez da sua mulher. Uma notícia surpreendente que deixou a
moça sem chão revirando sua cabeça e ainda motivou sua confissão para a colega
Gleice, de um grande segredo guardado a sete chaves entre ela e Osmar.
Ao sair da
casa de Leny naquele sábado, Antônio levou consigo a liberação do compromisso
assumido por seu filho Alexandre com relação àquele casamento. Foi o mínimo que
ele conseguiu após confessar a violência sexual do seu filho contra a moça.
Leny acabara de ver resolvida uma questão que muito a incomodava, mas precisava
estar pronta para aparar suas arestas com Osmar junto a seus pais. E essas
arestas teriam que ser aparadas aos poucos, gota a gota, até que seus pais
entendessem que a situação familiar do rapaz era um forte empecilho para a
união estável e sacramentada dos dois. Mas essa atitude ela teve que deixar de
lado pela reação do seu pai João quando, desconfiado e irritado, quis saber: - Agora que o Antônio foi embora, podemos conversar. Que história
é essa que ainda não sei de tudo? Porque você, Valdívia, achou por bem não
realizar o casamento?
Valdívia: - Porque seria um grande erro que geraria infelicidades
para Leny e principalmente para a criança.
João: - Não vejo como erro ou infelicidade uma criança ser criada
e educada pelos seus pais.
Valdívia: - Eu também, mas desde que essas pessoas sejam os seus
verdadeiros pais.
João: - Como assim? O que você está querendo dizer com isso?
Leny: - Que o Alexandre não é o pai do meu filho. Interrompeu a
filha com coragem e determinação.
João: - Então você se deitou com outro homem? É isso? Onde você
estava com a cabeça? E continuou bastante irritado: - Agora eu tenho em casa uma filha que vive se deitando com
homens pela rua! Você por acaso sabe quem é o pai desta criança aí na sua
barriga?
Valdívia: - Chega João! Sem ofensas para a menina! E finalizou,
levando Leny aos prantos: - Vamos subir para o seu
quarto e deixar o seu pai se acalmar.
João: - É isso mesmo Valdívia! Passe a mão na cabecinha
desmiolada da sua filha. Não posso me acalmar vendo você encobrindo os erros
dela e escondendo as coisas de mim.
Valdívia: - Não vou discutir com você agora! Prefiro cuidar da nossa
filha que está muito abalada. Ela está grávida, entendeu!
João: - Grávida de quem Leny? E arrematou ainda bastante
exaltado: - Diga-me se você tem certeza de
quem lhe encheu a barriga!
Leny e
Valdívia subiram as escadas, adentraram no quarto da garota e fecharam a porta.
Leny estava inconsolada e revoltada com as fortes palavras do pai, mas mesmo
assim, Valdívia num longo e afetuoso abraço, tentou acalmá-la: - Não ligue para o que seu pai acabou de dizer, minha filha. Ele
está nervoso e fala sem pensar.
Leny: - Mas ele só faltou me chamar de “vagabunda”! De mulher que
se deita com vários homens.
Valdívia: - Mas eu sei que isso não é verdade. E ele também.
Leny: - Não quero mais saber dele. Pra mim ele não existe mais.
Quando eu mais preciso de apoio e amparo ele faz uma ignorância dessas!
Valdívia: - O melhor que você tem a fazer agora é trazer esse seu
novo namorado aqui. Acredito que assim o seu pai volte a ficar mais
calmo.
Leny: - Não sei se devo ou se vou conseguir. Depois que ele soube
do meu casamento com o Alexandre, resolveu se afastar.
Valdívia: - O que fez muito bem. Mas ele sabe que é o pai da
criança?
Leny: - Não. Ainda não lhe contei esta novidade. Depois de saber do
meu casório temos nos visto poucas vezes. Mesmo assim em encontros ocasionais
na faculdade. A nossa relação acabou de vez. Respondeu a moça voltando
a encobrir a verdade, por entender que o melhor caminho seria preservar o rapaz
da presença do seu pai.
- Mais ele tem que saber você não acha? Se o filho é dele ele tem
que assumir. Questionou a
mãe com ares de cobrança.
- Se eu o conheço bem, não vai fugir disso. Mas não quero o meu
pai se metendo com ele. Determinou Leny.
Valdívia: - Mas ele é seu pai. Tem que se envolver, você queira ou
não.
Leny: - A partir de hoje ele não é mais o meu pai. E se você
quiser continuar sendo a minha mãe, não interfira nesse assunto.
Valdívia: - Ai, ai, ai. Você está sendo muito dura minha filha. Tenho
certeza que não é isso que você quer. Mas vou relevar, aguardar que se acalme e
volte a ser a Leny que a gente tanto ama, conhece e admira.
Leny: - Semana que vem vou ter uma conversa com o Osmar para
decidirmos a nossa vida. É este o nome dele mãe: Osmar. E não vários “Osmares”
como insinuou o meu pai.
Valdívia: - Então o traga aqui, que ele será bem recebido. Isso eu
garanto.
Leny; - Não vou trazê-lo e vou resolver este assunto pessoalmente
com ele. Mas tudo que eu decidir você ficará sabendo, porque você, além de ser
a minha mãe é mulher também. É diferente do meu pai porque você sabe
perfeitamente o que estou sentindo. O amor de mãe é abençoado e a gente não
renega um filho.
Valdívia: - E você daqui a pouco vai ser uma delas. E vai saber por
que eu me preocupo tanto com você.
Leny: - Agora mãe, deixe-me descansar. Quero evitar ver o meu
pai. O que for resolvido com o Osmar eu lhe conto. Abênção mãe.
- Deus lhe abençoe minha filha. Fique calma. Vamos deixar a
poeira baixar que tudo se resolverá com o seu pai. Despediu-se
Valdívia antes de sair e fechar a porta
do quarto da filha.
No dia
seguinte, domingo, Leny passou longe de seus pais e com o pensamento perto de
Osmar. Bem cedo, se aprontou e saiu para passear pelo bairro do Méier, no
subúrbio da cidade do Rio de Janeiro, próximo à sua casa no Grajaú. Visitou
lojas, fez algumas compras e almoçou num dos restaurantes do Shopping Center no
mesmo bairro, distraiu-se na praça e no "jardim" repleto de crianças
brincando no coreto, tirou fotos com um ambulante lambe-lambe, assistiu a um
filme no Cine Imperator e aproveitou o tempo livre para pesquisar nos
"Classificados do Jornal do Brasil", imóveis que estivessem em oferta
para locações. Assinalou cinco endereços de apartamentos que achou em
localidades interessantes e guardou-os para os devidos contatos no dia
seguinte. Com isso, a moça demonstrou ter levado muito a sério a proposta de Osmar
para arranjarem um cantinho para eles, cuja vontade foi agora reforçada por
conta da atitude intempestiva do seu pai no dia anterior. E Osmar teria que
estar pronto para receber mais esta carga pesada que, com certeza, chegaria com
os problemas pessoais de Leny com seus familiares.
No dia seguinte
de manhã, logo ao chegar ao trabalho, Osmar abriu um processo que havia sido
colocado estrategicamente em cima da sua mesa e deparou com o seguinte
bilhete: "Preciso muito falar com você
hoje. Espero-o no estacionamento logo após a saída". Osmar entendeu
o recado e devolveu o mesmo processo para Leny, com a observação de "OK"!
Nesse ínterim,
aproveitando o horário do almoço, Leny fez ligações para algumas imobiliárias
selecionadas no dia anterior e anotou observações importantes como o valor de
aluguéis, taxas e condomínios, endereços para avaliação, condições das locações
sob fiança ou depósito de meses antecipados, tempo de contrato etc.
Enquanto isso,
Osmar teve que antecipar a sua saída para o almoço para levar sua mulher
Yolanda ao médico, para mais uma consulta de pré-natal. Yolanda já estava
bastante cheinha com a sua barriga de quatro meses e Osmar já estava acostumado
com os cuidados que sempre proporcionava à esposa. Mas, mesmo assim, no
consultório médico acompanhado da mulher, ele não deixou de pensar em Leny que,
provavelmente, iria dar a luz a outro filho seu na mesma época do parto de
Yolanda. "Que situação"! Pensou
ele.
O dia passou
praticamente com os dois amantes longe um do outro, mas isso não impediu que
Osmar fosse encontrar-se com Leny como combinado, mesmo não tendo
retornado ao trabalho após a consulta da esposa. Osmar levou Yolanda de volta
pra casa aliviado com a boa avaliação médica sobre a sua gestação e retornou
imediatamente para buscar Leny, alegando para a esposa que teria provas na
faculdade.
Os dois se
encontraram entre beijos e abraços dentro do carro e, aproveitando o caminho
para a faculdade, Leny não perdeu tempo: -
Aquela sua proposta de arranjarmos um cantinho para nós ainda está de pé?
- Claro meu amor! Mas temos que conversar melhor sobre isso. Rebateu Osmar,
dando a entender que haveria algumas condições.
- Já estamos conversando meu amor. Continue, porque o assunto é
urgente. Devolveu Leny
com certos ares de cobrança.
- Porque tanta pressa agora? O que foi que aconteceu? Quis saber
Osmar, demonstrando preocupação.
- Eu tive uma discussão muito séria com o meu pai. Ele me
ofendeu. Quero sair de casa o quanto antes. Decidiu Leny aos prantos.
- Cuidado menina, não vá se precipitar. Brigar e se aborrecer com
o seu pai, só pode piorar as coisas. Tentou Osmar amenizar o assunto
com cautela.
Leny enxugando
as lágrimas: - Ele foi muito ignorante e
disse muitas coisas duras pra mim, Osmar. Ofensas que não se fala nem para uma
mulher de rua. Pra mim chega!
Osmar: - Nunca pensei que essa situação fosse chegar a esse ponto.
Foi por causa do fim do casamento?
Leny: - Também, mas a minha mãe já está sabendo que o motivo da
desistência do enlace é você. Falei o seu nome, mas escondi certas coisas.
Osmar: -Como assim?
Leny: - Não disse que você é um homem casado com família pra
sustentar. Ocultei até que trabalhamos na mesma empresa. Relatei apenas que
você é um colega da faculdade que resolveu se afastar após a história do
casamento.
Osmar
sentiu-se aliviado mais uma vez com as palavras de Leny, enquanto manobrava o
carro no estacionamento perto da faculdade.
Por isso, reconhecendo mais uma vez o cuidado que a menina demonstrou em
preservá-lo de aborrecimentos e problemas com seus pais, envolveu-a em seus
braços e, aos beijos, se mostrou solidário ao dizer: - O que posso fazer por você minha vida? Não quero vê-la triste e
chorona como está agora.
Leny: -- O que você pode fazer, é tirar-me daquela casa! Não quero
continuar confrontando o meu pai.
Osmar: - Mas você tem a sua mãe. Eles já sabem dessa decisão?
Leny: - Não, mas a minha mãe é diferente. Ela me escuta e me
aconselha.
Osmar: - Então não abandone essa proteção. A melhor que você pode
ter. Ela não vai concordar com essa decisão de sair de casa..
Leny: - Mas já está decidido por mim. Queria ter mais tempo para
pensar, mas não vai ser possível.
Osmar: - Mas você tem que pensar muito sobre isso. Uma mudança
drástica como essa na rotina da sua vida, pode não ser um bom caminho.
Leny: - O que foi agora? Está roendo a corda? Parece-me que você
está desistindo e dando para trás! Sinto-me abandonada e sem chão quando você
não está por perto. Senti a sua falta durante todo o segundo expediente de hoje
no trabalho. Qual o motivo desse sumiço?
Osmar: - Não quero desistir do compromisso, mas apenas combinar
tudo direitinho. Você está com a cabeça quente e não é o melhor clima para se
decidir algo assim de repente. Temos que acertar alguns ponteiros para
evitarmos problemas e cobranças no futuro.
.
Leny: - Então se explique. Que relógio é esse que precisamos
acertar as horas?
Osmar: - Já que você quer assim, escute-me agora e não me
interrompa. Entendo todo o seu desconforto e peço que você entenda o meu. Estou
completamente dividido em duas partes no meio dessa situação e não posso viver
sem uma delas. Se por um lado eu tenho você que é a minha paixão avassaladora,
por outro eu tenho a minha família que muito prezo pela boa convivência que
mantemos há bastante tempo. Pouco ou nada lhe digo sobre este outro lado meu e
nunca lhe dei esperanças de largar tudo por você. Adoro minhas filhas e nunca
passou pela minha cabeça deixá-las sem a minha presença de pai.
Leny: - Não só as suas filhas, mas a sua mulher também. Não é
isso?
Osmar: - Isso mesmo. Ainda mais no presente momento, que tenho que
estar mais perto dela.
Leny: - Ah! Entendi. Serei a outra na sua vida. A mulherzinha
extraconjugal pronta para ceder a seus caprichos e seus desejos.
Osmar: - Não se desvalorize meu amor, porque o meu amor por você é
imenso. Não quero você apenas para o sexo, mas sim, estar junto de ti sempre
que possível.
Leny: - Só que esse possível vai depender do outro lado. Se
empatar, eu já sei qual o time que vai ganhar o jogo na prorrogação.
Osmar: - E outra coisa: você acabou de perguntar e não posso
deixar de responder. O motivo da minha ausência no trabalho hoje à tarde, foi
que precisei levar a Yolanda ao médico.
Leny: - Nossa! O que está acontecendo com ela?
Osmar: - Sou muito transparente com você, Leny. Não quero lhe
enganar com nada e sinto que algumas notícias podem até desagradá-la. Às vezes,
posso até deixar de comentar certos fatos da minha vida pessoal, mas mentir
nunca. Sou a favor da verdade boa ou ruim.
Leny: - E qual é a verdade agora que é boa ou ruim?
Osmar: - É que a “a minha mulher também está grávida”! Quatro
meses de gestação igual a você.
Leny: - Nossa! Agora mesmo é que ferrou tudo. Notícia boa pra
você e ruim pra mim. Não sei o que faço agora.
Osmar: - Temos que fazer o melhor dentro das nossas limitações.
Não posso abandonar você e muito menos a minha mulher.
Leny: - Então você quer ficar com as duas, é isso? Só que eu vou
ser sempre a outra.
Osmar: - Não vejo outra saída, pelo menos no momento. Entenda a minha
situação, querida.
Leny: - Olha aqui Osmar, bem em meus olhos. Quando deixei aquele
recadinho no seu processo hoje de manhã, estava convicta que você iria dar uma
boa resposta à minha decisão de sair de casa. Até acredito na sua proposta de
alugarmos um cantinho para nós, mas essa notícia de agora colocou uma pedra de
gelo em cima. Não
posso e nem devo aceitar ser a outra, sem qualquer perspectiva de um futuro
melhor.
Osmar: - O futuro a gente constrói e você não pode alegar que não
haja perspectiva. Essa gravidez da Yolanda não foi planejada, como também não
foi a sua. Mas já que aconteceu, eu tenho que assumir as responsabilidades.
Leny: - Que responsabilidade é essa comigo, se você não poderá
estar ao meu lado a toda a hora e a todo o momento? Eu vou sair de casa sim,
mas vou tratar da minha vida sozinha. Não se preocupe mais comigo e vá cuidar
da sua família. O nosso caso termina aqui.
Osmar: - Que é isso, Leny? Não seja precipitada. Deixa-me cuidar
de você, até o tempo nos mostrar uma saída.
Leny: - Não haverá saída nenhuma Osmar, nós sabemos disso. Você
nunca me deu esperanças e não posso reclamar de nada. Portanto, só posso
desejar que sejamos felizes daqui pra frente, mas cada um em seu canto.
Osmar: - Mas isso não está certo. Não vou deixar você sozinha
nesse estado. Você vai precisar da minha companhia.
Leny: - Faça companhia à sua mulher que é o melhor que você pode
fazer. Quanto a mim, não se preocupe. Eu tenho quem pode me socorrer. Acabou
Osmar! Repito: acabou Osmar! Não me procure mais.
Leny, ao dizer
essas últimas palavras, soltou do carro e foi assistir às aulas. Osmar,
estupefato e preocupado, acionou o veículo e foi embora para casa. No caminho,
dirigindo com pensamentos que rodeavam a sua cabeça, o rapaz chegou à conclusão
que não suportaria, dali pra frente, ter Leny tão perto dele no trabalho e tão
longe de seus abraços. E por causa dessa situação, Osmar começou a estudar com
carinho a proposta de outro emprego que estava aguardando a sua resposta já há
algum tempo. A mudança de ares e de cidade, além de lhe trazer outras
experiências profissionais significaria, no entanto, a fuga de sérios problemas
que só os covardes conseguem cometer. E ele não era nenhum covarde para ir
embora pra bem longe e deixar essa situação mal resolvida com a sua amada.
Apesar da rejeição e posição de Leny, Osmar resolveu dar um tempo nesse projeto
de mudança profissional, para tentar reconquistar a moça que tanto amava.
Resolveu lutar por ela com todas as suas forças e enfrentar o que fosse preciso
para não magoar o seu ego. Mas reconhecia, também, que não podia descartar o
enriquecimento do seu lado profissional com a proposta vantajosa que havia
recebido.
Leny, por
outro lado, não desistiu da ideia de morar longe dos pais, cuja decisão sofreu
um impacto negativo após o último encontro com Osmar. De posse dos contatos
imobiliários, chegou a visitar alguns imóveis para locação, mas não conseguiu
decidir nada por inexperiência. Valores de aluguéis, necessidade de fiança,
depósitos antecipados, localização e principalmente a ausência do personagem
masculino envolvido, provocaram um grande desânimo na ação da moça. Mas ela não
desistiu...
Leny lembrou
então, que diante dela, naquela sala da secretaria do departamento, estava
alguém que muito provavelmente poderia lhe dar algumas dicas. E ela,
completamente desorientada, dirigiu-se à sua colega: - Gleice, preciso muito conversar com você. Que tal um almoço hoje?
- Claro! Não dispenso uma boca livre. Acedeu Gleice com
surpresa e de forma irônica.
- O que foi que houve Leny? Em que posso ajudá-la? Questionou
curiosamente Gleice, logo ao acomodarem-se à mesa do restaurante.
Leny: - É que estou querendo morar sozinha e preciso de umas
orientações. E ninguém melhor do que você que é independente.
Gleice
admirada: - Mas o que é isso agora? Ainda
mais no seu estado! Não estou entendendo. E o casamento?
Leny: - Isso é uma história complicada. O meu casamento foi só no
religioso.
Gleice: - Mas foi abençoado. Pelo que sei, os papéis estavam
correndo, não é mesmo?
Leny: - Estavam, mas não estão mais. Desisti de me amarrar
agora.
Gleice: - Nossa! Que coragem! Você está louca? E o seu noivo, seus
pais e parentes? O que vão achar disso?
Leny: - Quanto ao noivo eu já mandei andar e parece que não volta. O
meu pai brigou comigo e me ofendeu. Por isso, quero sair de casa.
Gleice: - Mas isso passa Leny. Abandonar a sua casa por causa de
uma briguinha com o seu pai é uma decisão muito impensada. Não faça isso. Você
está grávida.
Leny: - É que você não conhece o meu pai e não foi apenas uma
briguinha. Não estou suportando mais ele. Andei procurando alguns apartamentos
para alugar, mas nada consegui. Você conhece alguém que possa me ajudar com
isso?
Gleice: - Posso até tentar pra você. Lá no meu prédio sempre
aparecem imóveis vazios. Mas pense bem...
Leny: - Então me diga alguma coisa amanhã. Tenho pressa.
Gleice: - Vou fazer de tudo para conseguir, mas se eu soubesse o
porquê dessa decisão, de repente a minha ajuda seria outra.
Leny: - Que bom ouvir isso Gleice. Sinto-me tão só e
abandonada...
Gleice: - Quem tem amigos não pode se sentir abandonada. O Osmar,
por exemplo, parece-me gostar muito de você.
Leny: - Gosta até demais. Mas ele tem os seus problemas com a
família. Ainda mais agora que a sua mulher também está grávida.
Gleice: - Caramba! E o cara nunca me falou nada! Tenho que lhe dar
os parabéns.
Leny: - Mas eu prefiro que aguarde a notícia da parte dele.
Apesar de não me pedir nenhum segredo, prefiro não passar por indiscreta.
Gleice: -Tudo bem. Mas, mesmo assim, ele pode lhe ajudar. O Osmar é um
homem muito amigo e parceiro. Tem bons conhecimentos e amizades que poderão lhe
ser úteis.
Leny: --Você já reparou que, como agora, todas as vezes que
conversamos, o nome de Osmar vem à baila?
Gleice: - E porque isso? Porque será que ele sempre está na
berlinda?
Leny: - Não sei e nem quero saber. Deixe-o pra lá.
Gleice: - É porque Leny, você não consegue esconder mais os seus
sentimentos por ele. Você não diz, mas o envolvimento entre vocês dois está
muito claro.
Leny: - Porque isso agora? Por acaso ele lhe contou algo?
Gleice: - Imagina! Nada disso! Parece até que você não o conhece
bem. O Osmar é um túmulo de segredos. Sempre foi muito discreto em suas
relações pessoais.
Leny: - Então porque a indireta? Parece-me que você sabe mais do
que eu!
Gleice: - Eu gostaria até que você abrisse o jogo. Seria muito bom
pra você desabafar e aliviar suas tensões. Quero muito de lhe ajudar.
Leny: - A minha história com o Osmar só pertence a mim. E ele não
gostaria dessa exposição.
Gleice: - Epa! Você acabou de confirmar tudo minha amiga. Não sei
se foi sem querer ou querendo. Mas fique tranqüila, porque não vai passar
daqui, com todo o respeito que vocês dois merecem.
Leny: - Não confirmei nada, apenas fiz um comentário sobre a
nossa história.
Gleice: - História de paixão e muito amor entre vocês, não é mesmo?
Não me subestime Leny, porque não é de hoje que já entendi tudo.
Leny: - E você não deve estar gostando nada disso, não é mesmo?
Sempre notei a sua queda por ele.
Gleice: - Mas isso eu já cansei de lhe falar. Sou mais transparente
do que você. Mas reconheço também, que não tenho nenhuma chance com ele. Fazer
o quê?
Leny: - Nossa! Eu lhe chamei pra almoçar por causa de um problema
particular e o assunto descambou para outro lado. Não adiantou nada.
Gleice: - Vai adiantar sim Leny, porque eu sinto que você está
precisando de mim. Quero ajudá-la nesse seu momento difícil. Mas você precisa
sair de cima do muro. Como posso lhe ajudar, sem saber os verdadeiros
motivos?
Leny
completamente indefesa, carente e solitária: -
Tudo bem. O que você quer saber?
Gleice: - Tudo que influiu na sua decisão de querer sair de casa.
Como essa conversa vai ser longa, convido-a para um lanche logo mais no meu
apartamento, após a saída do trabalho. É aqui pertinho da empresa.
Leny: - Tudo bem. Combinado. Quem sabe você não encontra uma
solução para o meu problema!
Gleice: - Vou fazer o possível minha amiga, conte comigo.
E assim foi
feito. Após o expediente, Gleice levou Leny até o seu apartamento em rua bem
próxima do trabalho. Era um prédio residencial de dez andares, com quatro
apartamentos em cada um deles. Prédio bem construído e conservado por
condomínio rigoroso com a limpeza e a disciplina de seus empregados. Gleice e
Leny pegaram o elevador até o sétimo andar e adentraram pela porta indicativa
do número 702. Leny ao admirar a boa arrumação e cuidado daquele espaço confortável
com sala, dois quartos, cozinha, banheiro e dependência de empregada, não se
conteve ao afirmar: - Que beleza é isto aqui
Gleice! O seu apartamento é muito aconchegante e a vista é maravilhosa
vislumbrada desta janela de frente para a Baía da Guanabara. Parabéns pelo
esmero e cuidado que você dedica ao seu cantinho.
Gleice: - Mas isso dá muito trabalho. Geralmente reservo os finais
de semana para arrumações e limpeza. A rua aqui é muito poeirenta pelo grande
movimento dos carros. Mas não reclamo não, porque prezo muito o asseio e a
higiene.
Leny: -- Queria tanto arranjar um cantinho igual a este para mim... Preciso me libertar dos meus pais.
Gleice: - Já lhe disse pra pensar bem. Não faça de mim um exemplo,
porque a minha história não é igual a sua.
Leny: - Então qual é a sua! Porque se separou de seus pais?
Gleice: - Porque praticamente eu não os tive. E é por reconhecer a
importância que tem uma família unida, que ainda quero tirar essa idéia maluca
da sua cabeça.
Leny: - Mas a minha família está em conflito por causa do meu
pai. Não posso continuar dentro de um lar suportando as ofensas que tenho
recebido. Você não sabe, mas o meu pai quase me comparou a uma prostituta.
Gleice: - Já sei. Tudo por causa da sua gravidez antes da hora.
Isso sempre acontece nas melhores famílias.
Leny: - Foi exatamente esse o motivo. E tudo piorou porque eu
desisti do casamento com o Alexandre.
Gleice: - Pois é. Porque isso se houve até a cerimônia
religiosa?
Leny: - Simplesmente Gleice, porque o meu ex-noivo não é o pai da
criança. E eu confessei isso para o meu pai.
Gleice: - Caramba! Que situação! Mas eu acho que você agiu certo. O
cara não deveria levar a culpa por algo que não cometeu.
Leny: - Verdade. Mas ele também não é nenhum santo. Tenho algumas
broncas dele que não vem ao caso no momento.
Gleice: - Então...
- Então Gleice, aqui vai o que você está doida pra querer saber!
O pai da criança é o Osmar! O Osmar ouviu bem? Adiantou-se Leny cortando as palavras da colega.
Gleice
estupefata largou o lanche que estava preparando na cozinha enquanto conversava
com a amiga, correu e se acomodou abruptamente ao lado da colega no sofá da sala.
A notícia era uma bomba que acabou de ser detonada pela confidente. Gleice sempre
desconfiou do relacionamento dos dois, mas nunca poderia imaginar que chegaria
a este ponto. Alguns fatos passaram pela sua cabeça numa velocidade impressionante
e ela lembrou naquele momento, com bastante exatidão, do dia que tudo começou
quando ela alertou Osmar sobre a rejeição a ele por parte de Leny e,
principalmente, das suas palavras: "quem
desdenha quer comprar". Mas, ao ouvir a confissão da
colega, Gleice, de forma direta e sem rodeios, colocou pra fora a única
pergunta que o momento pedia: - E o Osmar
já sabe disso?
Leny: - Sim. Tanto sabe que se ofereceu para montar um cantinho
para nós. Fiquei empolgada quando ele falou dessa intenção.
Gleice: - E porque esse papo agora comigo? Vá em frente!
Leny: - Cheguei até a selecionar alguns endereços para locações
nos classificados do jornal desse domingo e contatar alguns deles na
segunda-feira. Ontem, cheguei a vistoriar alguns apartamentos, mas a indecisão
e a inexperiência fizeram-me dar uma travada e procurá-la.
Gleice: - E o Osmar, menina? Porque ele não está lhe ajudando com
isso, se a idéia foi dele? Não estou entendendo...
Leny: - Porque eu terminei tudo com ele, quando soube da gravidez da
sua mulher. Veja você, apesar de nunca ter comentado nada, imaginava que a sua
relação com a mulher estivesse em crise. Ainda mais quando prometeu morarmos
juntos.
Gleice: - Entendo. Você estava cheia de esperanças e a notícia dele
foi uma grande decepção para você.
Leny: - Tinha certeza que ele me ajudaria e daria força para eu
sair de casa, mas não foi isso que eu senti. Antes de revelar aquela péssima
notícia, tentou me demover insistentemente da minha decisão.
Gleice: - Mas eu acho que você não deveria dispensar o Osmar num
momento tão complicado como esse. Ainda mais se tratando de um cara tão leal e
amigo como ele.
Leny: - Eu sei disso e estou até pesarosa pela sua
inconseqüência, ao engravidar duas mulheres quase ao mesmo tempo.
Gleice: - Mas ele não planejou isso, tenho quase certeza. Foi uma
surpresa para ele.
Leny: - Foi o que ele disse no caso da sua mulher.
Gleice: - E no seu caso? Você não procurou evitar?
Leny: - Nem pensei nisso na hora da empolgação, mas ele estava
preocupado.
Gleice: - E mesmo assim ele foi em frente?
Leny: - Ele deu uma segurada com receio da minha condição e não
insistiu com nada. Foi um verdadeiro cavalheiro.
Gleice: - E foi aí que você se entregou, não é mesmo? Demonstrou
que você podia confiar em seus sentimentos.
Leny: - Verdade. Deixou-me bem à vontade e só se decidiu quando
lhe falei que estava me prevenindo com anticoncepcionais.
Gleice: - Então, agora mesmo é que não estou entendendo nada com
esta gravidez. Algo deu errado?
Leny: - Deu errado para ele, porque eu não estava tomando remédio
nenhum.
Gleice: - Credo! Você enganou o Osmar? Isso não se faz! Que
irresponsabilidade foi essa!
Leny: - Este tipo de encontro mais envolvente foi decidido por
mim de uma hora para outra. Estava apaixonada por ele e fiquei desesperada
quando ele terminou tudo comigo.
Gleice: - E resolveu se entregar para reverter a situação, é isso?
Leny: - Eu lhe dei o presente que ele sempre quis, mas que sempre
evitava para me preservar.
Gleice: - E que presente foi esse minha amiga?
Leny: - A minha virgindade. Foi ele o primeiro homem na minha
vida. E só aconteceu por minha insistência.
Gleice: - Nossa! Que coisa mais louca! Estou abismada com a sua
coragem!
Leny: - Não foi só coragem não. Foi muito desejo e não me
arrependo. Foram momentos maravilhosos que teve reprise várias vezes.
Gleice: - E porque acabar com esses momentos maravilhosos que podem
continuar cheios de prazeres? Continue curtindo o que lhe faz bem.
Leny: - Porque não vejo nenhum futuro pra mim nessa relação. Ele
preza a família dele e está comprometido demais com sua mulher e filhas.
Gleice: - Mas, antes disso, você sabia que ele era casado. Porque
continuou insistindo?
Leny: - Tentei terminar várias vezes evitando a sua companhia e
me afastando dele. Mas ele sempre insistia pra voltar e eu acabava cedendo.
Seus argumentos e seu carisma são muito fortes. Quase irresistíveis.
Gleice: - Isso aí pra mim não é novidade. É um tipo de amizade que
cola e não solta.
Leny: - E eu só senti a sua importância quando ele resolveu
acabar com tudo. Engraçado, não é mesmo? Terminei várias vezes e quando isso
partiu da parte dele eu tomei aquela atitude intempestiva que você acabou de saber.
Gleice: - Mas o amor é assim mesmo, nos surpreende a todo o
momento.
Leny: - Pois é. E por causa dele, estou aqui colocando o meu
coração pra fora. Estou completamente desorientada sem saber o que fazer, após
dizer tantas palavras duras para o Osmar.
Gleice: - E pelo visto, sem qualquer razão. Você acabou de
deixar-me preocupada com o meu amigo. Até imagino como ele está se sentindo no
meio desse fogo cruzado.
Leny: - Mas ele não pode saber dessa nossa conversa, pelo amor de
Deus! Nunca iria me perdoar por essas inconfidências.
Gleice: - Mas preciso ajudá-lo, como também não posso deixá-la
sozinha nessa confusão. Vou pensar no que fazer por vocês.
Leny: - Mas vá com calma e discrição. Preciso preservar,
inclusive, a minha imagem no trabalho. Agradeço a sua ajuda com isso.
Gleice: - Então não se precipite em querer sair de casa agora.
Nesses momentos conturbados, a melhor companhia é a da sua mãe e, acredito
também, a do seu pai.
Leny: - Vou seguir o seu conselho, prezada colega. Muito obrigado
pela paciência em escutar meus desabafos e pela solidariedade. Vou deixar você
descansar porque amanhã será outro dia.
- Isso mesmo Leny. Pensamentos positivos e bola pra frente. Rebateu Gleice
saindo com a colega até o ponto do ônibus que a levaria de volta pra sua casa.
Leny saiu
levando seus problemas sem imaginar, no entanto, como eles também incomodaram a
sua amiga. Gleice ficou preocupada com a situação de Osmar e, após um banho
relaxante, não conseguiu pegar no sono que insistia em não chegar. Seus
pensamentos iam e viam em cada rolada na cama e não chegavam a um ponto comum.
Ela sempre foi uma pessoa solidária e encontrava-se angustiada por sentir como estava difícil encontrar uma
solução que pudesse indicar a porta de saída para aqueles dois. Mas...
É o que
veremos no próximo capítulo: “COM A CARA E A CORAGEM"
Seu romance me envolveu com quatro capítulos hoje. Sinal de que é envolvente mesmo. Pausa hoje, amanhã continuo. Parabéns pelo drama,muito bem narrado.
ResponderExcluir20/09/16 06:25 - ELIE MATHIAS
ResponderExcluirMAGNIFICO E PRIMOROSO LINDAMENTE INSPIRADO E NARRADO.APLAUSOS MIL
POETA OLAVO.
22/09/16 16:48 - Angely Negreiros (não autenticado* - IP:
ResponderExcluir179.107.105.114)
Tudo certinho, amei ler a sua novela, com tanta ficção e realidade.
Parabéns! Vai em frente e procura uma TV para levar a frente.
Bjs.
(*) usuários não autenticados são aqueles que não se identificaram no
site através de login e senha.
22/01/17 22:15 - Deyse Felix
ResponderExcluirSinto que a Leny está bem desajustada. O Osmar não se chama PÊ, mas
está em "um mar que não está pra peixe"...rs. O que Osmar fará? Ele
precisa ter muita coragem para enfrentar o Seu João que está "bem
irado". <<< Tive uma ideia sobre o desfecho, porém não irei contá-la
agora. Aguarde. >>> Ah! fui ao seu blog. Consegui "dar uma voltinha".
Logo voltarei para começar a apreciá-lo.
17/11/17 22:11 - Iolanda Pinheiro
ResponderExcluirA história só se complica. Que situação!
16/04/19 19:01 - António Souza
ResponderExcluirSituação constrangedora Leny, não sabia da gravidez da mulher de
osmar... e agora...? Posso imaginar o que vai acontecer, mas ... vamos
em frente... Abraços! Acho que pulei um capitulo, o décimo, voltei pra
ler segue o raciocínio, até aqui... tá coerente.