ANÉIS EM PEDAÇOS
- Beijos meus amor. Torça por mim. Despediu-se
Leny subindo a sua rua, com os pensamentos em alvoroço. Mas...
Estas foram as
últimas palavras de Leny ao se despedir de Osmar naquela noite de sexta-feira.
Ao chegar em casa, ainda transtornada pelo que aconteceu na quarta-feira com Alexandre, evitou se abrir com sua mãe, que insistia: - O que está havendo com você minha filha? Anteontem
eu vi você chegar triste e aborrecida, subiu para o quarto e não voltou
mais.
Valdívia: - Assim espero e volto a lhe pedir
pra não esconder nada da sua mãe. Além de lhe ver triste, tenho notado você sem
a aliança. Vocês brigaram?
Valdívia: - Mas isso passa logo. Briga boba
de namorados é assim mesmo. Daqui a pouco vocês voltam a se entender.
Leny: - Depois que você souber o que
aconteceu, não vai achar que foi briga boba. Estou com ódio dele e não quero
vê-lo nunca mais na minha frente.
Valdívia: - Agora fiquei preocupada. O que
ele fez com a minha menina? Conte tudo e não me esconda nada.
Leny: - Vamos deixar isso para amanhã
mãe. Hoje não dá. Vou tomar um banho, deitar e procurar esfriar a cabeça.
Ao deixar sua
mãe toda preocupada, Leny subiu e entrou no banho. E enquanto aquela água morna
caía da sua ducha, os seus pensamentos lhe trouxeram a imagem de Osmar
acariciando-a e excitando-a naquele banho a dois do último encontro no hotel.
Leny estava apaixonada e somente a lembrança de Osmar a transportava para outra
viagem, bem longe do turbilhão que ela estava vivendo. Ela se ensaboava e se
tocava com os olhos fechados para sentir a presença dele naquele momento. E lhe
chamava através do silêncio que vinha da força do seu pensamento: "Vem meu
amor! Como eu preciso de você agora!
O banho foi
demorado, relaxante e prazeroso com as carícias em seu próprio corpo, que lhe
trouxeram o descanso necessário e o sono tranquilo que a serenidade da imagem
de Osmar lhe proporcionava. Dormiu pensando nele, acordou pensando nele e não
deixou de pensar nele no decorrer do final de semana, apesar do clima
complicado entre as duas famílias de noivos com seus anéis em pedaços.
- E lembre-se que sempre estaremos dispostos a lhe defender e a lhe
ajudar. Completou seu
pai João mostrando solidariedade.
- Então diga o que foi menina! Determinaram a mãe e o pai ao
mesmo tempo.
- Não estou gostando nada disso! Ou você se abre ou vou lá buscá-lo
agora! Ameaçou João.
Alguns meses
depois, para ajudar nas despesas de casa, João conseguiu um biscate de ajudante
nas feiras livres que percorriam as ruas do bairro durante a semana. Também
acordava de madrugada, mas voltava no início das tardes para almoçar em casa e
se preparar para as aulas na escola pública perto da sua residência. João
completou o primário que tinha abandonado em Pernambuco para ajudar o pai na
roça, mas teve que deixar o ginásio no segundo ano por motivos de trabalho. Com
dezesseis anos começou a aprender o ofício de serralheiro e, mais tarde, se
especializou, com a sua experiência, em moldar peças especiais de ferro e metais.
Cresceu na profissão e tornou-se muito conhecido no bairro do Grajaú como um
grande artífice na arte de criar ferramentas, fechaduras, grades para janelas
etc. Abriu o seu próprio negócio que ainda mantinha até hoje com três
empregados, cuja renda lhe proporcionou comprar a casa em que morava e criar os
três filhos sem atropelos ou dificuldades. Era uma família simples, mas
bastante conhecida e considerada no bairro pelos vizinhos.
João era bom
de briga, mas só entrava nela se fosse provocado, apesar de muitas vezes tentar
evitar. Não foram poucas vezes as que João se meteu em encrencas,
desavenças e discussões para defender seus direitos e sua honra. E por Valdívia
saber disso, tentou conter o marido.
- Não vá cometer nenhuma besteira João! Vamos esperar o Alexandre se
explicar antes de qualquer coisa. Determinou Valdívia, continuando em direção a
Leny: - Agora você vai
contar o que aconteceu, porque não está certo esconder seus problemas de nós.
Vamos lá! Conte!
- Ele me forçou ao sexo, mãe. Tentei evitar, mas ele foi mais forte. Confessou Leny, constrangida e com lágrimas nos olhos.
- Como é que é? Como foi isso? Aonde aconteceu? Fale logo Leny! Interrompeu João aos gritos e com irritação.
- Mas você poderia ter recusado o pedido do pai dele, quando respondi
que a decisão de aceitar o pedido de noivado era sua. Questionou João.
- E eu tive tempo! A surpresa com aquela gente toda à minha volta,
deixou-me indecisa e sem ação. E quando dei por mim, o anel já estava no meu
dedo com todos aplaudindo. Que raiva! Exasperou-se Leny, continuando: - Mas ainda não acabei a história. O Alexandre
colocou-me dentro de um táxi e quando dei por mim, estávamos entrando num
motel. Estranhei e recusei num primeiro momento, mas ele me convenceu em subir
apenas para conversar. Ele queria saber o porquê da minha indiferença e das
mudanças das minhas atitudes com ele.
- Mas não havia outro lugar mais discreto para conversar? Pelo que sei, motéis não são os lugares ideais para reuniões e palestras! Você ao entrar
com ele, mesmo não querendo, deu a entender que você estava a fim de algo mais,
além de despertar o desejo dele. Repreendeu Valdívia sem acreditar
muito na versão da filha.
- Mas eu estava a fim de só conversar mesmo e tentar terminar com
ele numa boa, sem ressentimentos e mágoas. Justificou-se Leny, continuando: - Mas ele não deu tempo para qualquer assunto e foi
logo pra cima de mim, mostrando a que veio e o que queria. Reclamei, gritei,
chorei e me debati, mas ele estava possesso. Era um Alexandre que ainda não
conhecia. Ele estava fora de si e magoado pela minha rejeição.
- E aconteceu, não foi Leny? Quis saber a mãe.
- Então ele lhe violentou? Que canalha! Esbravejou
João dando um soco na mesa com ódio nos olhos e ameaçando: - Ele me paga!
-- Não vai fazer nada João, até ele vir
aqui se explicar. Fique calmo e pense na sua família. Determinou
Valdívia preocupada com o gênio do marido.
João, muito a
contragosto, resolveu atender a mulher e aguardar o outro lado. Apesar do clima
tenso, aumentado com o contragosto do seu irmão Carlos que presenciou tudo e
colocou mais lenha na fogueira, o dia passou com tristeza e indignação,
enquanto se aguardava as explicações de Alexandre. Mas...
- Como assim? Explique-se! Indignou-se João diante de uma Leny
boquiaberta pela afronta de Antônio.
- Mas a Leny alega que ele forçou o sexo com violência. Isso é caso de
polícia! Ameaçou João.
- Não foi bem assim. Segundo o Alexandre, houve concordância dela. Devolveu Antônio
de imediato, causando a pronta reação de Leny:
- Então traga o covarde do seu filho aqui para falar isso na minha cara!
Ele foi um cavalo, imbecil e ignorante!
No dia
seguinte de manhã, domingo, João se aprontou, tomou um gole de café e, com cara
de poucos amigos, saiu ouvindo os pedidos de Valdívia para se controlar. Duas
horas depois ele voltou e adentrou em sua casa não só com o Alexandre, mas com
os seus pais também.
- Mas você está gostando de alguém? Quis saber a mãe.
-- Mas foi o que ele me disse e estou acreditando. Rebateu
Antônio sem dar os braços a torcer.
- Então saia daqui agora e vá buscá-lo, por que quem está acreditando na
minha filha sou eu! Exasperou-se João.
- E vá logo buscar o seu filhinho! Levantou-se
Leny empurrando Antônio pela porta afora.
- E se ele nõo vir eu vou buscá-lo amanhã na sua casa. E acho bom não me
contrariar. Finalizou
João cheio de razões e contrariedades.
Antônio saiu e
os pais de Leny tentaram acalmá-la. Apesar de não concordarem com ela por ter
entrado num motel com Alexandre, eles abraçaram a filha com a proteção e o apoio
que ela estava precisando. Disseram confiar e acreditar na sua versão e que
nunca a deixaria sozinha e abandonada em qualquer circunstância. Leny se sentiu
confortada e agradecida, beijando-os com carinho e respeito. Mas, infelizmente,
Antônio não trouxe o filho Alexandre como exigiu João.
Após os
cumprimentos normais da manhã, acomodaram-se na sala e o rapaz foi questionado
imediatamente por João: - Vamos lá meu
rapaz! Repita na frente de Leny o que você falou pra mim a pouco na sua casa.
- Antes de qualquer coisa, quero dizer que a Leny é o amor da minha
vida. O que aconteceu foi uma relação mais intensa entre nós, dentro de um
ambiente propício e acolhedor. Começou Alexandre tentando virar o jogo.
- Mas ela alega que essa relação foi forçada por você, após
imobilizá-la. Rebateu
João com irritação.
- Foi isso mesmo que aconteceu? Confessa Alexandre! Interrompeu Leny com fogo nos olhos.
- O que aconteceu foi permitido por você, ao ingressar comigo naquele
hotel. Injuriou Alexandre
colocando o corpo fora.
- Fale a verdade seu covarde! Seja homem! Entrei por que você garantiu
que iríamos apenas conversar. Exasperou-se Leny com indignação.
- Conversar também para entender a sua distância e rejeição após o
noivado. Queria que você confirmasse ou não, se existe outro em sua vida. O
motivo só pode ser esse seu João, a sua filha deve estar com outro alguém. Queixou-se Alexandre com o amor ferido.
- Se estou com outro alguém não lhe interessa. O que interessa agora é
que você está mentindo e não tem coragem de falar a verdade. Você me atacou
dentro daquele hotel e fez de mim uma presa fácil com a sua força. Você me
possuiu sem eu querer seu animal nojento. Reagiu Leny com agressividade.
- Vamos com calma gente. Sem ofensas e agressões ao meu filho. Tentou amenizar Antônio.
- É um animal sim! E sabe por quê? Porque, se eu tivesse permitido,
não teria jogado a aliança na cara dele. Continuou Leny com disposição de provar suas
palavras.
- É a palavra de um contra o outro. Difícil saber a verdade... Argumentou Antônio ainda defendendo o seu
filho.
- A verdade é a minha. Diga Alexandre! Confessa seu tarado! Exasperou-se a
moça levantando-se da poltrona, espalmando o rosto e socando o peito do rapaz
com raiva.
- Chega! Vamos acabar com isso! Fora todos daqui! Gritou Valdívia com irritação.
- Estou acreditando na minha filha e vou defendê-la com unhas e dentes.
Não apareça mais na minha frente rapaz! Isso é caso de polícia ou de lavada de honra.
Sumam daqui! E torçam para não termos surpresa daqui a nove meses,
porque aí o bicho vai pegar. Determinou e ameaçou João ao abrir a porta expulsando-os da sua casa.
Quanto à
surpresa em nove meses, Leny lembrou logo da primeira vez com Osmar e das
pílulas anticoncepcionais que alegou estar tomando para encorajá-lo e deixá-lo
mais à vontade naquela noite. Mas, agora, começou a arrepender-se por não ter
se resguardado com elas.
As visitas
indesejadas saíram e, após se acalmarem, os pais de Leny, lembrando da ocasião que ela passou a noite fora, quiseram saber se ela
realmente perdeu o interesse pelo noivado e se estaria com outro alguém como alegou Alexandre.
E a filha respondeu: - Depois que
comecei a trabalhar, conheci outras pessoas, outros lugares e senti que ainda é
muito cedo para me prender a um casamento. O Alexandre me ocupava o tempo todo
e reparei que a vida não é só isso. Estou contente com o meu primeiro emprego,
quero passar no vestibular de final de ano, cursar uma faculdade, me formar e
crescer como gente. Naquela noite que entrei no hotel, eu pretendia mesmo
acabar com ele, mas deu tudo errado por culpa dele.
- Mas você está gostando de alguém? Quis saber a mãe.
- Você sempre pede para não esconder nada de você, como sempre fiz. Mas
isso eu escondi até agora. Estou sim mãe. Estou amando alguém maravilhoso.
Alguém que está me mostrando o verdadeiro amor. Confirmou
Leny, pedindo perdão em seguida por guardar aquele segredo.
- E naquele dia que passaste a noite fora, você estava com ele não foi? Quis saber um desconfiado João.
- Estava com ele naquela esticada até à discoteca e ele trouxe-me de
volta pra casa. Esclareceu Leny omitindo
o principal motivo da sua noitada.
- Quem é esse rapaz? O que ele faz? Traga-o aqui para nos
apresentar. Surpreendeu-se e aconselhou Valdívia.
- A situação ainda está muito recente mãe. Deixa-me ter certeza das
intenções dele. Não quero decepcioná-los mais uma vez. Ele é um colega da
faculdade já formado em administração, cursando outra cadeira para melhorar
seus conhecimentos. Está empregado em uma grande empresa. Despistou
Leny.
-- Mas veja lá o que você vai fazer com esse rapaz.
Lembre-se que uma moça de família não deve se envolver com pessoas
comprometidas, nem ficar curtindo momentos prazerosos sem envolvimento sério. Alertou João preocupado com a nova situação da filha,
após a triste relação carnal que acabou de ser comprovada entre ela e
Alexandre.
-- Tudo bem meu pai, não vou me esquecer disso. Aceitou Leny concordando com os conselhos de João, mas incomodada com a frase "pessoas comprometidas" que
atingiu o seu peito como uma flecha atirada por Osmar.
23/02/2016 14:49 - ELIE MATHIAS
ResponderExcluirCriativa e bela novela. Aplausos poeta Olavo.
Pamela Mércia
ResponderExcluirTem bastante sentimento e talvez um certo arrependimento.
Boa sorte...
Conflitos que podem tomar outro rumo ou terminar mal. Muito criativo, realista, diálogo descrito de maneira a envolver o leitor. Parabéns e sucesso caro Poeta Olavo.
ResponderExcluir12/01/17 15:11 - Deyse Felix
ResponderExcluirO que será, será! Resta aguardar. E quanto ao Alexandre, homem sempre
se sai como se fosse um herói. A mulher é sempre a presa fácil, a que
se entrega, e isto mesmo se o acontecido fora contra a vontade dela. E
sempre acreditam mais no homem. >> Boa tarde.
20/09/17 19:55 - Iolanda Pinheiro
ResponderExcluirA coisa vai complicada, ainda bem que ela se livrou do Alexandre. E o
pai dele é outro cretino.
09/04/19 20:07 - António Souza
ResponderExcluirAs mulheres à muito são desacreditadas mesmo no âmbito familiar é
lamentável; vimos aqui nesse capítulo a falta de caráter do Alexandre
e a desesperança da jovem que já está apaixonada por outro pilantra.
Bela desenvoltura na história, meus parabéns! Vamos em frente, meu
abraço!